Solitary Daze

Hoje eu acordei ao meio-dia. Ainda com muito sono da noite passada, em que fui dormir quando já passava das quatro-da-manhã. Pra que me preocupar com horário se eu nem sequer sei se hoje é terça, ou quarta? É tanto dia que falha a memória. Tanto dia que a gente não quer, mas parece até que joga fora. Enfim, acordei e logo depois voltei a dormir. Parece que nada faz muito sentido quando a gente não sente o atordoar do dia passando pela nossa frente, que a gente não vê amanhecer, entardecer e anoitecer. Tem dias que a gente se dá ao trabalho de olhar pra janela e nem mais é dia, já é escuro e daqui, do meio da cidade, nem estrela a gente vê. Depois de acordar hoje pela segunda vez, eu me forcei a sair um pouco na janela, a ouvir uma música boa, me mexer um pouquinho, pra ver se enganando a mente, o corpo podia acordar também. Me peguei com uma linda surpresa de um pôr do sol em tons de rosa, roxo e laranja. Sinceramente, foi a coisa mais bonita que eu vi em um mês inteiro. Diria que até uma das coisas mais bonitas que eu já vi e ponto. Foi como uma amiga definiu, e definiu bem: foi como um respiro no meio de tudo isso. E acho que é disso que eu precisava, respirar, no meio de tanta crise, tanto ar que falta e ansiedade que sobra. Sei que já tá batido falar de ansiedade, de crise e vírus, mas parece que mesmo que sem ninguém pedir, todo mundo recebeu esse combo, de mão beijada, sem saber quando vai poder se livrar. Mas não é pra menos, quando parecia estar tudo entrando no eixo, veio tudo isso e acabou nos colocando numa tela, frente à frente com os nossos terapeutas pra chamadas de urgência. Justo quando eu comecei a ir certinho na academia, a trabalhar integral e receber um pouco melhor, a ter planos pra todos os finais de semanas seguintes. A gente foi convidado a se retirar; das nossas próprias vidas, das nossas rotinas, das nossas mesas de bar. E quem diria que em uma cidade tão cinza e com fama de solitária, a gente iria pirar em ficar sozinhos? Parece que a gente tem tempo demais pra pensar, pra refletir, pra arrumar a casa, pra decidir o que a gente quer arrumar na vida. É como se estivessem obrigando a gente a meditar, virar monge por um mês ou mais, e com tanta meditação, é como se imprimissem uma lista de tudo que tá errado e colocassem bem na nossa frente, nos forçando a abrir os olhos, como naquela cena de ‘’Laranja Mecânica’’. Tá todo mundo pirando, todo mundo ponderando. Entre gente tirando mais diplomas e gente fazendo exercício na varanda, eu tô ali no meio. Arrumo mais uma gaveta, decoro de novo a sala, o escritório, a cozinha, pra fugir da bagunça que me fizeram fazer na minha própria cabeça. Era tanta coisa que eu sabia que teria que lidar quando ficasse sozinha, por isso eu me enfio cada vez mais no meio de gente. Agora que tiraram meu refúgio de estar no meio de multidões, eu comemoro ter marcado minha terapia online pra amanhã! Ufinha.

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